A palavra flagrante origina-se do latim flagrare, que significa queimar ou arder. Desta forma, a situação de flagrância acontece quando o crime está atual, ou seja, está queimando ou acabara de acontecer. Assim, para o Direito, a prisão em flagrante pode ser realizada tanto por agentes de segurança pública como, também, por qualquer pessoa do povo que vislumbre tal evento.
Neste sentido, a prisão em flagrante é considerada uma medida precautelar que acontece quando há uma situação de flagrante delito. Quer dizer, alguém te flagra ao cometer um crime ou logo após sua execução. Desse modo, você poderá ser preso.
Diante disso, a prisão em flagrante se torna um mecanismo de autodefesa da sociedade e não depende de autorização judicial para ser realizada. Outrossim, qualquer pessoa pode decretar uma prisão em flagrante. Entretanto, a polícia ESTÁ OBRIGADA a decretar a prisão em flagrante, pois do contrário, incorrerá em omissão.
NUCCI, em sua obra de Direito Processual Penal Comentado, afirma que para as autoridades policiais, a lei impôs o dever de efetuar a prisão, sob pena de responder criminalmente e funcionalmente pelo seu descaso, classificando esse flagrante como compulsório. Para os agentes policiais a prisão deve ser feita durante as 24 horas do dia, quando possível. Quando qualquer pessoa do povo fizer a prisão de alguém em flagrante, ela estará agindo pela excludente de ilicitude de exercício regular de direito (art. 23, III, CP), já quando a prisão for feita por agente de polícia, nesse caso estamos falando de estrito cumprimento de dever legal (art. 23, III, CP).
A principal finalidade desta modalidade de prisão é interromper a conduta criminosa, se possível, antes mesmo que o crime se consuma. Além disso, outra função prevista na prisão será o de evitar a fuga do infrator, e, também, viabilizar a colheita e preservação de elementos probatórios.
O inciso LXI do artigo 5º da nossa Constituição Federal, define que:
Art 5º, LXI, CF – ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei
Destaca-se que a prisão em flagrante não subsiste na análise do processo judicial, ela sempre será convertida em uma medida cautelar, em liberdade provisória ou relaxada nos casos em que contiver ilegalidades. Por isso, é considerada uma medida precautelar como preceitua o art. 310[1], CPP. Com grande perfeição conclui Lima (2011, p. 182):
Sem embargo de opiniões em contrário, pensamos que a prisão em flagrante tem caráter precautelar. Não se trata de uma medida cautelar de natureza pessoal, mas sim precautelar, porquanto não se dirige a garantir o resultado do processo, mas apenas objetiva colocar o capturado à disposição do juiz para que adote uma verdadeira medida cautelar.
No entanto, a prisão em flagrante possui tipos distintos de classificação, sendo:
I. Flagrante próprio ou real: é quando a pessoa está em pleno desenvolvimento dos atos executórios da infração penal. E, havendo a intervenção de alguém, impedindo, pois, o prosseguimento da execução, pode redundar em tentativa. Não é raro que, em caso de crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, a efetivação da prisão ocorra para impedir, apenas, o prosseguimento do delito já consumado.
II. Flagrante impróprio: é quando a pessoa concluiu a infração penal, ou ainda, quando foi interrompido pela chegada de terceiros, mas sem ser preso no local do delito, pois consegue fugir, fazendo com que haja a perseguição por parte da polícia, da vítima ou de qualquer pessoa do povo. A lei usou a expressão "em situação que faça presumir ser autor da infração", demonstrando, com isso, a impropriedade do flagrante, já que não fora surpreendido em plena cena do crime.
III. Flagrante presumido: Constitui-se na situação em que a pessoa, logo depois da prática criminosa, embora não tenha sido perseguida, é encontrada portando os instrumentos, armas, objetos ou papéis que demonstrem, por presunção ser ela a autora da infração penal. É o que comumente ocorre nos crimes patrimoniais, quando a vítima comunica à política a ocorrência de um roubo e, a viatura sai pelas ruas do bairro à procura do carro subtraído, por exemplo. Visualiza-se o autor do crime algumas horas depois, em poder do veículo, dando-lhe voz de prisão.
IV. Flagrante preparado/provocado: trata-se de mero arremedo ou embuste de flagrante, e ocorre quando uma pessoa provoca, induz ou instiga alguém a cometer uma infração penal, somente para assim, poder prendê-la. Trata-se, enfim, de crime impossível, previsto no artigo 17 CP[2], pois é inviável a consumação delitiva.
A Súmula 45 do STF, ensina: Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”. É certo que esse preceito menciona apenas a polícia, mas nada impede que o particular também provoque a ocorrência de um flagrante somente para prender alguém. Diante disso, estarão presentes os requisitos para relaxamento da prisão, uma vez que ela é considerada ILEGAL.
V. Flagrante esperado: é uma hipótese viável de autorizar a prisão em flagrante e a constituição válida do crime. Neste caso não há agente provocador, mas simplesmente chega à polícia a notícia de que um crime será, em breve, cometido. Após isso, desloca agentes para o local, aguarda-se a sua ocorrência, que pode ou não se dar da forma como a notícia foi transmitida.
Logo, é viável a sua consumação, pois a polícia não detém certeza quanto ao local, nem tampouco controla a ação do agente criminoso. Enfim, poderá haver delito consumado ou tentado, conforme o caso, sendo válida a prisão em flagrante, se efetivamente o fato ocorrer. Cabe destacar, no entanto, que o art. 17 do nosso Código Penal, ser possível uma hipótese de flagrante esperado transformar-se em crime impossível. Por exemplo, caso a polícia obtenha a notícia de que um delito vai ser cometido em algum lugar e consiga armar um esquema tático infalível de proteção ao bem jurídico, de modo a não permitir a consumação da infração de modo nenhum, trata-se de tentativa inútil e não punível, tal como prevista no art. 17 do Código Penal.
Portanto, atualmente, a prisão é tratada no ordenamento jurídico brasileiro como algo extremo. Algo que para ocorrer deverá ser preenchido de uma justificativa robusta e contundente para impor à pessoa, supostamente criminosa, a consequência mais extrema que é a privação de liberdade. Logo, a liberdade é um direito fundamental protegido/resguardado e que só pode ser afastada em circunstâncias muito peculiares.
Como consequência dos números expressivos de prisões, o STF se manifestou, declarando que a situação do sistema carcerário brasileiro é um “estado de coisas inconstitucional”.
Umas das medidas positivas decorrentes desse posicionamento do Supremo Tribunal Federal, foi a Resolução CNJ nº 213/2015, referente as audiências de custódia, criadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para que o Poder Judiciário exerça o controle sobre eventuais prisões ilegais. Estas audiências ocorrem nos casos de prisão em flagrante, situação em que o indivíduo deverá ser submetido, no prazo máximo de 24 horas, a um juiz que decidirá sobre a legalidade e a necessidade da prisão para relaxá-la – ou seja, liberando a pessoa para responder em liberdade – ou convertê-la em prisão preventiva.
Nesse sentido, as audiências de custódia surgem como uma iniciativa muito relevante para lidar com o “estado de coisas inconstitucional” declarado pelo STF. Dessa maneira, cumprir a letra da constituição é fazer cumprir a presunção da inocência e a prisão como medida extrema. Portanto, as audiências de custódia são instrumento para reduzir o número de presos provisórios com o objetivo de manter preso, única e exclusivamente, aqueles que efetivamente representam algum tipo de perigo a sociedade.
Diante do que fora apresentado, podemos considerar que a prisão em flagrante é um ato legítimo muitas vezes, mas que por outras pode ser ilegal, já que, nesta última, originada de vícios dos autores. Logo, devemos resguardar os direitos fundamentais previstos em nossa Carta Magna, a fim de trazer segurança a toda sociedade.
REFERENCIAS:
[1] Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente: I - relaxar a prisão ilegal; ou II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. [2] Art. 17 - Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.
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